Apesar da ideia inicial deste blogue ser a divulgação de ideias científicas, não posso deixar de transcrever um artigo de opinião que saiu hoje no jornal "Público".
Para pensar...
Para pensar...
«A propaganda oficial no seu melhor
Santana Castilho
Oprimeiro-ministro apresentou o Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) e a ministra da Educação as 50 medidas de política com que diz estar a melhorar a escola pública. Foi a propaganda oficial no seu melhor, a merecer análise.
Durante os próximos sete anos, Bruxelas transferirá para Lisboa, diariamente, oito milhões, quatrocentos e catorze mil, oitocentos e setenta euros! Um milhão, seiscentos e oitenta e dois mil, novecentos e setenta e quatro contos em cada um dos próximos 2555 dias!
Sem surpresa, a qualificação dos portugueses e a educação juntaram-se à ciência e ao desenvolvimento tecnológico para preencherem os objectivos propagandísticos de Sócrates, anunciados com uma convicção que não convence. Por duas razões, uma de passado, outra de presente.
Comecemos pelo passado. É cansativo, pelo menos para quem tem memória, ouvir o mesmo discurso há décadas, quando nada acontece senão o contrário do que se apregoa. Os enormes fluxos financeiros que arribaram ao país nos tempos de Cavaco e Guterres deram o quê? O chavão da qualidade, do segundo ciclo da governação cavaquista, que sucedeu à época do betão da primeira maioria, deu o quê? A paixão pela educação, de Guterres, deu o quê? O choque tecnológico de Sócrates deu o quê? A mais alta taxa de abandono escolar da Europa, o último posto em todas as medidas de proficiência cognitiva, a menor taxa de frequência e conclusão de estudos secundários e superiores, a população activa menos qualificada e que menos se quer qualificar.
Já que tanto lhes agrada falar de resultados, estes são os resultados das estafadas prioridades para a educação. Visível, o betão e a corrupção, os jipes, as negociatas, a impunidade das criaturas que nos têm governado, sem competência nem talento. Virtual, a miragem do desenvolvimento dos outros: a Irlanda primeiro, agora a Finlândia, daqui a pouco a Eslovénia.
Mas a razão do presente não é menos relevante. O que deram as políticas de Sócrates, até hoje? Uma noção de desenvolvimento assente no definhamento dos que trabalham e no enriquecimento dos grupos dominantes, com dois milhões de assalariados a empobrecerem desde que ele é governo. Um desprezo nunca visto pelas pessoas, cujos direitos são imolados sem piedade em nome de um darwinismo económico que as leva a parir em Espanha, morrer em Odemira, porque os cuidados estão em Lisboa, ou aprender as primeiras letras a duas horas de autocarro de casa.
De que qualificação e de que portugueses fala este neoliberal empedernido, que nos habituou a esperar o contrário do que diz, que sovieticamente centrou tudo nele e já reservou mais de metade do pecúlio para as suas obras faraónicas (Ota e TGV)?
Ao mesmo nível propagandístico e sem crédito estão as 50 medidas com que a ministra da escola mínima se auto-elogia. Li e tive pena de nós, portugueses. Umas medidas têm relevância para merecerem o nome, embora sejam de coveira e não de ministra, embora piorem em vez de melhorar. A elas já me referi, autonomamente, à medida que foram surgindo. Outras são simplesmente ridículas.
Veja-se, por exemplo, como corriqueiras iniciativas de gestão menor, corrente, ganham foros de medidas de política no reino duma criatura que perdeu o sentido do caricato: homologação das cartas educativas; isenção do imposto automóvel para viaturas de transporte escolar de câmaras municipais; organização de uma conferência sobre ensino artístico; edição de um guia de acesso ao ensino secundário.
Um comentário ao expoente máximo da demagogia e da bazófia quando se destaca a criação de 500 cursos profissionais com 20.000 novos alunos. Está a falar de quê, senhora ministra? De novos planos de estudos de cursos tecnológicos, de cariz profissional relevante, servidos por novas oficinas e laboratórios, modernamente equipados e assistidos por técnicos competentes para ensinar a fazer, ou está a falar da cosmética que aplicou aos anteriores curricula alternativos, de má memória e "eduquês" lógica? Como sabe que são 20.000 novos alunos?
Ora revele lá donde vem essa gente. E diga-nos também que formação têm os professores que mobilizou e que equipamentos comprou. Não esqueça uma palavrinha para caracterizar o impacto que a sua medida teve nas escolas profissionais sérias, que estoicamente vão resistindo. Professor do ensino superior»
Artigo original em:
Público
Durante os próximos sete anos, Bruxelas transferirá para Lisboa, diariamente, oito milhões, quatrocentos e catorze mil, oitocentos e setenta euros! Um milhão, seiscentos e oitenta e dois mil, novecentos e setenta e quatro contos em cada um dos próximos 2555 dias!
Sem surpresa, a qualificação dos portugueses e a educação juntaram-se à ciência e ao desenvolvimento tecnológico para preencherem os objectivos propagandísticos de Sócrates, anunciados com uma convicção que não convence. Por duas razões, uma de passado, outra de presente.
Comecemos pelo passado. É cansativo, pelo menos para quem tem memória, ouvir o mesmo discurso há décadas, quando nada acontece senão o contrário do que se apregoa. Os enormes fluxos financeiros que arribaram ao país nos tempos de Cavaco e Guterres deram o quê? O chavão da qualidade, do segundo ciclo da governação cavaquista, que sucedeu à época do betão da primeira maioria, deu o quê? A paixão pela educação, de Guterres, deu o quê? O choque tecnológico de Sócrates deu o quê? A mais alta taxa de abandono escolar da Europa, o último posto em todas as medidas de proficiência cognitiva, a menor taxa de frequência e conclusão de estudos secundários e superiores, a população activa menos qualificada e que menos se quer qualificar.
Já que tanto lhes agrada falar de resultados, estes são os resultados das estafadas prioridades para a educação. Visível, o betão e a corrupção, os jipes, as negociatas, a impunidade das criaturas que nos têm governado, sem competência nem talento. Virtual, a miragem do desenvolvimento dos outros: a Irlanda primeiro, agora a Finlândia, daqui a pouco a Eslovénia.
Mas a razão do presente não é menos relevante. O que deram as políticas de Sócrates, até hoje? Uma noção de desenvolvimento assente no definhamento dos que trabalham e no enriquecimento dos grupos dominantes, com dois milhões de assalariados a empobrecerem desde que ele é governo. Um desprezo nunca visto pelas pessoas, cujos direitos são imolados sem piedade em nome de um darwinismo económico que as leva a parir em Espanha, morrer em Odemira, porque os cuidados estão em Lisboa, ou aprender as primeiras letras a duas horas de autocarro de casa.
De que qualificação e de que portugueses fala este neoliberal empedernido, que nos habituou a esperar o contrário do que diz, que sovieticamente centrou tudo nele e já reservou mais de metade do pecúlio para as suas obras faraónicas (Ota e TGV)?
Ao mesmo nível propagandístico e sem crédito estão as 50 medidas com que a ministra da escola mínima se auto-elogia. Li e tive pena de nós, portugueses. Umas medidas têm relevância para merecerem o nome, embora sejam de coveira e não de ministra, embora piorem em vez de melhorar. A elas já me referi, autonomamente, à medida que foram surgindo. Outras são simplesmente ridículas.
Veja-se, por exemplo, como corriqueiras iniciativas de gestão menor, corrente, ganham foros de medidas de política no reino duma criatura que perdeu o sentido do caricato: homologação das cartas educativas; isenção do imposto automóvel para viaturas de transporte escolar de câmaras municipais; organização de uma conferência sobre ensino artístico; edição de um guia de acesso ao ensino secundário.
Um comentário ao expoente máximo da demagogia e da bazófia quando se destaca a criação de 500 cursos profissionais com 20.000 novos alunos. Está a falar de quê, senhora ministra? De novos planos de estudos de cursos tecnológicos, de cariz profissional relevante, servidos por novas oficinas e laboratórios, modernamente equipados e assistidos por técnicos competentes para ensinar a fazer, ou está a falar da cosmética que aplicou aos anteriores curricula alternativos, de má memória e "eduquês" lógica? Como sabe que são 20.000 novos alunos?
Ora revele lá donde vem essa gente. E diga-nos também que formação têm os professores que mobilizou e que equipamentos comprou. Não esqueça uma palavrinha para caracterizar o impacto que a sua medida teve nas escolas profissionais sérias, que estoicamente vão resistindo. Professor do ensino superior»
Artigo original em:
Público
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