segunda-feira, janeiro 29, 2007

Propaganda oficial no seu melhor...

Apesar da ideia inicial deste blogue ser a divulgação de ideias científicas, não posso deixar de transcrever um artigo de opinião que saiu hoje no jornal "Público".

Para pensar...

«A propaganda oficial no seu melhor
Santana Castilho
Oprimeiro-ministro apresentou o Quadro de Referência Estratégico Nacional (QREN) e a ministra da Educação as 50 medidas de política com que diz estar a melhorar a escola pública. Foi a propaganda oficial no seu melhor, a merecer análise.
Durante os próximos sete anos, Bruxelas transferirá para Lisboa, diariamente, oito milhões, quatrocentos e catorze mil, oitocentos e setenta euros! Um milhão, seiscentos e oitenta e dois mil, novecentos e setenta e quatro contos em cada um dos próximos 2555 dias!
Sem surpresa, a qualificação dos portugueses e a educação juntaram-se à ciência e ao desenvolvimento tecnológico para preencherem os objectivos propagandísticos de Sócrates, anunciados com uma convicção que não convence. Por duas razões, uma de passado, outra de presente.
Comecemos pelo passado. É cansativo, pelo menos para quem tem memória, ouvir o mesmo discurso há décadas, quando nada acontece senão o contrário do que se apregoa. Os enormes fluxos financeiros que arribaram ao país nos tempos de Cavaco e Guterres deram o quê? O chavão da qualidade, do segundo ciclo da governação cavaquista, que sucedeu à época do betão da primeira maioria, deu o quê? A paixão pela educação, de Guterres, deu o quê? O choque tecnológico de Sócrates deu o quê? A mais alta taxa de abandono escolar da Europa, o último posto em todas as medidas de proficiência cognitiva, a menor taxa de frequência e conclusão de estudos secundários e superiores, a população activa menos qualificada e que menos se quer qualificar.
Já que tanto lhes agrada falar de resultados, estes são os resultados das estafadas prioridades para a educação. Visível, o betão e a corrupção, os jipes, as negociatas, a impunidade das criaturas que nos têm governado, sem competência nem talento. Virtual, a miragem do desenvolvimento dos outros: a Irlanda primeiro, agora a Finlândia, daqui a pouco a Eslovénia.
Mas a razão do presente não é menos relevante. O que deram as políticas de Sócrates, até hoje? Uma noção de desenvolvimento assente no definhamento dos que trabalham e no enriquecimento dos grupos dominantes, com dois milhões de assalariados a empobrecerem desde que ele é governo. Um desprezo nunca visto pelas pessoas, cujos direitos são imolados sem piedade em nome de um darwinismo económico que as leva a parir em Espanha, morrer em Odemira, porque os cuidados estão em Lisboa, ou aprender as primeiras letras a duas horas de autocarro de casa.
De que qualificação e de que portugueses fala este neoliberal empedernido, que nos habituou a esperar o contrário do que diz, que sovieticamente centrou tudo nele e já reservou mais de metade do pecúlio para as suas obras faraónicas (Ota e TGV)?
Ao mesmo nível propagandístico e sem crédito estão as 50 medidas com que a ministra da escola mínima se auto-elogia. Li e tive pena de nós, portugueses. Umas medidas têm relevância para merecerem o nome, embora sejam de coveira e não de ministra, embora piorem em vez de melhorar. A elas já me referi, autonomamente, à medida que foram surgindo. Outras são simplesmente ridículas.
Veja-se, por exemplo, como corriqueiras iniciativas de gestão menor, corrente, ganham foros de medidas de política no reino duma criatura que perdeu o sentido do caricato: homologação das cartas educativas; isenção do imposto automóvel para viaturas de transporte escolar de câmaras municipais; organização de uma conferência sobre ensino artístico; edição de um guia de acesso ao ensino secundário.
Um comentário ao expoente máximo da demagogia e da bazófia quando se destaca a criação de 500 cursos profissionais com 20.000 novos alunos. Está a falar de quê, senhora ministra? De novos planos de estudos de cursos tecnológicos, de cariz profissional relevante, servidos por novas oficinas e laboratórios, modernamente equipados e assistidos por técnicos competentes para ensinar a fazer, ou está a falar da cosmética que aplicou aos anteriores curricula alternativos, de má memória e "eduquês" lógica? Como sabe que são 20.000 novos alunos?
Ora revele lá donde vem essa gente. E diga-nos também que formação têm os professores que mobilizou e que equipamentos comprou. Não esqueça uma palavrinha para caracterizar o impacto que a sua medida teve nas escolas profissionais sérias, que estoicamente vão resistindo. Professor do ensino superior»

Artigo original em:
Público

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